sexta-feira, 10 de maio de 2013

Os retornados de hoje.



O amor-ódio existe. 
Detestava estudar a disciplina de História, mas adorava saber tudo o que ela nos tinha para contar.
Foi sempre uma paixão, que até então se tinha mantida bem quieta no seu lugar, até à bem pouco tempo, não fosse um despertador feio e rabugento que me fizesse acordar para ela.
A crise tem mudado os meus pensamentos em várias valências. A história, a Nossa História, a História de um povo chamado Português tem movido em mim fontes e janelas para um outro lado do cais.
Ainda que numa outra era, com valores muito distintos, com leis completamente firmes e antagónicas, um outro despertador também tocava. 
Hoje, acordamos com total desconhecimento do dia posterior, ainda que nos permaneça algumas vezes, um sentido apurado de luta, persistência e liberdade, e por essa razão, acabamos por acreditar sempre em alguma coisa, nem que seja, uma pequena manutenção anual de um automóvel.
No ontem, as pessoas também acreditavam que a realidade (e bem fundamentada pelo que se sabe), era a de uma vida rica e cheia de momentos prazerosos de altas rodagens. Mas como em toda a roda, ela fez marcha-atrás, e eles ainda que incrédulos voltaram. Retornaram.
Sim, falo dos Retornados. 
Sim, sei que ao falar-vos deles ou de si (caso o seja), falo de feridas profundas e nunca saradas. 
Não irei descrever sentimentos e remorsos porque não estava cá para contar o quão difícil foi abandonar um sofá onde se sentavam todos os dias a conversar sobre as noticias (algumas atrasadas) chegadas de Portugal. Não sei como foi difícil dizer adeus aos que, pior ou melhor, nos davam  pequeno-almoço diariamente, e que durante anos tiveram que prestar vassalagem a nós. Uns mereceram-na, não duvido. Outros nem por isso. E tudo isto é dito por mim, que desconheço aquilo que apenas conheço nas páginas dos livros de História que eu detestava ler, e que agora voltei a abri-los.
Passou pouco tempo, mas precisei de os reler. Necessitei de confirmar o que fomos, e o que já não fazemos. O que fizemos, e o que já não somos. Senti um terrível e inacabado desejo de entender que tudo isto não passa de uma roda, de um círculo ou de outra coisa qualquer que se possa denominar, e que se caracterize por algo que foi, e voltou.
Nós fomos, conquistámos, abusámos e perdemos. Ao descolonizar o que nos pertencia, descolonizá-mo-nos a nós mesmos. 
Agora, e de boca segura digo (porque vivo) este instante desorganizado, a crise além de ter chegado ao país, bateu-nos à porta do quarto, onde estávamos tranquilamente a tentar amarrar o sono, que até esse nos tem faltado.
Agora quis o destino, que nós portugueses voltássemos a sair, com a diferença de habitar colónias de outros (mais espertos que nós? Sim. Mais inteligentes? Não.)
Futuros retornados?
.....
Talvez, mas para onde?

M.C


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